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A Briga

Quando era criança, morei em um condomínio onde fiz diversos amigos. Sempre brincando juntos, acabamos montando uma espécie de grupo, eram mais ou menos oito meninos que sempre se reuniam para fazer alguma coisa. Na maioria das vezes jogávamos futebol, outras tantas brincávamos de polícia e ladrão, e em algumas brigávamos.

Numa tarde, estávamos reunidos conversando sobre alguma coisa. Um dos presentes era um menino que nunca se deu muito bem comigo – vivíamos nos estranhando em todas as oportunidades que surgiam, e naquela tarde não seria diferente.

Como começou me falha a memória, só sei que ele começou a me encarar e me xingar. Eu como nunca fui de brigar, fiquei todo sem jeito. Não tinha medo, apenas não queria me envolver naquilo. Ele começou a me empurrar com seu peito, enquanto eu o empurrava levemente com as mãos. Sentia a expectativa do resto do pessoal crescer, uma vez que eramos dois que impunham certo respeito, talvez em função do tamanho e da idade. Não era todo dia que veriam uma briga de "gigantes”.

Ele continuava a me empurrar, falando que eu deveria empurrar ele como homem. Eu apenas respondia que era melhor ele parar, enquanto seguia afastando-o com as mãos. Para ele um "homem de verdade" deveria empurrar alguém com o peito, ou “peitar”, como ele mesmo dizia. O pessoal a nossa volta começava a incentivar, todos num misto de euforia e medo do que podia acontecer. Enquanto isso permanecíamos em nossa dança: ele “peitava”, eu afastava; me mandava empurrar, eu mandava parar.

Ficamos nessa dança até que ele realmente se irritou. Nesse momento o motivo da briga não fazia o menor sentido. Ele enfurecido grita: "empurra como homem!". Eu em resposta o empurro com toda a força de meus ombros. Todos se calam a nossa volta enquanto ele voa para trás, tirando os dois pés do chão e aterrizando violentamente de cabeça no concreto

A plateia assustada corre para socorrê-lo, rapidamente colocando-o sentado com as costas apoiadas. O silêncio é geral enquanto ele chora. Em meio as lágrimas ele pergunta: "E agora?". O medo me gela o sangue ao ver que ele não consegue mover muito bem a mão. Todos se mantém em silêncio, esperando pelo desfecho daquela situação. "E agora?" – ele grita me mostrando sua mão e a grande dificuldade que tinha para mover o polegar – "como é que vou jogar videogame?!". Todos explodem numa gargalhada enquanto ele chorando se levanta e vai embora.

Esse fato entrou para a história daquele condomínio, nunca mais sendo esquecido por nós. Até hoje, anos mais tarde, ainda perguntam para ele: “como é que vai jogar videogame?”

14.04.2016

 

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